Kadib Abyad

O documentário trabalha com um conceito interessante, em que a realizadora reuniu os seus familiares e antigos vizinhos numa sala para recordarem o passado das suas famílias e da sua rua, principalmente no contexto do massacre de civis em Marrocos no início dos anos 80, que aconteceu em resposta às manifestações contra o aumento do preço do pão. Os poderosos relatos pessoais são depois acompanhados por imagens ilustrativas feitas numa maqueta de cartão detalhada dessa rua e da zona em redor, com todas as casas e moradores da época, na qual cada um deles tem a sua figurinha de barro. A procura da verdade abre feridas antigas, mas o confronto entre os moradores de uma casa (sobretudo em relação à avó rígida e despótica, a cujas regras todos tinham de obedecer) não provocou provavelmente tantos conflitos durante a filmagem como a realizadora poderia ter esperado. Assim, as recordações do passado são intercaladas com imagens mais quotidianas de uma festa de aniversário ou da mãe da realizadora a cantar. A promessa inicial de um olhar através das mentiras que a matriarca intransigente e receada por todos construiu ao longo dos anos fica assim por cumprir, pois nem sequer é claro em que deveriam consistir essas mentiras. (07/07/2023)